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Foto do escritorTroque o Disco

Nada mais nada menos que: The Beatles


O que escrever sobre os Beatles que ainda não tenha sido escrito?


Quem me conhece sabe do meu amor pela banda, mas (diferente de tantos fãs) eu não “endeuso” os caras. Reconheço ali 4 talentosas personalidades sinérgicas que foram arremessadas para além do auge da fama ainda muito jovens, sem qualquer referência do que aquilo significaria para a época. Frequentemente escuto “os Beatles são superestimados” ou “não sei onde está a genialidade ali”. Eram virtuosos? Não, mas inquestionavelmente diferenciados.


Durante sua, diga-se de passagem, breve trajetória (foram apenas 8 anos em estúdio) os caras produziram 13 álbuns, sendo um destes duplo (White Album) e lançaram tantos singles que geraram outro álbum duplo (Past Masters). Experimente comparar fotos da banda no comecinho da carreira (1962) e na reta final (1969). Parece que foram apenas 8 anos?


Os dois primeiros discos, Please Please Me e With The Beatles, foram feitos ao vivo, cada um gravado em apenas um dia. Ali, já apontavam uma quebra do padrão da época: pelo menos metade daqueles discos trazia canções autorais, numa época em que reinavam os covers. Antes dos Beatles, as bandas populares eram divididas entre os grupos de harmonias vocais — como Temptations, Supremes e Shirelles — e os roqueiros clássicos como Chuck Berry e Little Richards. Como os Beatles uniam o melhor dos dois mundos, muita gente se viu redundante e precisou se reinventar.


A partir dali seus discos eram recheados primariamente por músicas originais. Fizeram filmes (e ganharam um Oscar!), desenhos animados, experimentaram instrumentos exóticos e até orquestras com guitarras distorcidas enquanto desenvolviam novas técnicas de gravação, quebraram todos os recordes da indústria (e ainda sustentam alguns), mudaram completamente a forma como músicos interagiam com a imprensa, se meteram em política e filosofia oriental, e se mesclaram à cultura pop vigente de forma quase simbiótica. Tudo isso em meros 8 anos.


Contudo, não demorou para deixarem de ser aqueles meninos deslumbrados pelas novidades. Eram homens feitos, com relógios biológicos diferentes, necessidades e prioridades muitas vezes antagônicas, e novamente forçados a amadurecer precocemente quando precisaram se tornar seus próprios empresários. Pressão, perdas, drogas, relacionamentos abalados, os Beatles — e muitos fãs — finalmente entenderam que não eram deuses, mas meros mortais. Muitas vidas vividas em menos de uma década.

O recente filme “Yesterday” trouxe o exercício criativo de imaginar um mundo onde os Beatles nunca existiram. Diverte, mas não acho que o filme tenha feito a devida justiça. Então lhes convido a conferir um outro filme, o documentário "Eight Days a Week - the Touring Years", de 2016. Este cobre os breves anos das turnês dos Beatles (gente, foram apenas 3 anos de turnês mundiais!), e contextualiza cobrindo os principais eventos mundiais da primeira metade dos anos 60, e como o mundo estava mudando.


Duas passagens me chamaram especialmente a atenção sobre sua segunda visita aos EUA, em 64. Na primeira, um jornalista americano, Larry Kane, teria sido convidado a acompanhar o grupo em sua excursão: seriam 25 shows em 30 dias, indo de uma costa à outra do país. Kane estava bastante hesitante, afinal, Kennedy tinha sido assassinado recentemente, a situação no Vietnam se intensificava, o Ford Mustang acabara de ser lançado, Muhammad Ali treinava a três quadras do estúdio onde ele trabalhava, enfim, trocentas novidades acontecendo semanalmente, por que ele perderia seu tempo viajando com uma banda que estaria ali para o mês e seria esquecida no seguinte?


Bom, ele encarou e reportou diariamente a experiência. Suas palavras: "Permitam-me comentar qual o sentimento após vê-los em ação 15 vezes, e suas plateias... É excitante, pois estou presenciando um fenômeno único neste século, e que provavelmente ficará na história como o maior exemplo de admiração e show business no meio musical por eras." Alguém ali mordeu a língua...


O segundo momento destacou a passagem do grupo pelo sul do país, ainda na mesma turnê, onde protestos acalorados tomavam as ruas sobre conflitos raciais e segregação. Havia dúvida sobre a viabilidade do show deles por conta da tensão, e durante uma entrevista os Beatles foram sondados sobre separação racial em shows. A resposta? "Não gostamos da ideia, porque parece loucura. É meio idiota segregar pessoas, não? Não dá para tratar outros seres humanos como animais. É como nos sentimos, e na Inglaterra também. Na verdade, se houvesse esse tipo de coisa lá, nós nem tocaríamos." E ali, em Jacksonville, Flórida, foram enfáticos: se houvesse qualquer tipo de segregação, não tocariam.


Uma jovem negra comenta do medo que ela teve de ir àquele show. Ela estava ilhada por gente branca, mas seu desconforto evaporou quando se deu conta que ninguém prestava atenção nela. Todas aquelas brancas barulhentas estavam sentindo a mesma euforia que ela, e foi a primeira vez que ela se deu conta de que era possível sim um mundo onde todos são iguais.


Temos ainda depoimentos de gente como Whoopi Goldberg dizendo o quanto os Beatles abriram suas mentes. “Eles eram diferentes de tudo visto antes, e ainda assim tinham essa aura de ‘podemos ser amigos’. Se me perguntavam, ‘mas você é negra e quer ser como aqueles branquelos?’, a resposta era ‘eles são os Beatles, eles não têm cor!’


E isso os define bem. A obra dos Beatles-grupo transcende a biografia dos Beatles-homens. Uma banda que acabou há mais de 5 décadas e continua sendo referência quando alguém novo bate algum recorde musical. Até hoje, ninguém teve suas músicas regravadas mais vezes que os Beatles. E foram míseros 8 anos de produção.

Você não precisa gostar de Beatles para entender sua importância ou o peso da sua influência. De Jimi Hendrix a David Grohl, de Ozzy Osbourne a Gene Simmons, de Bruce Springsteen a Sting, de Richie Samborra a Adam Levine, incontáveis lendas do rock e pop dão crédito aos Beatles por terem escolhido fazer música. Até ícones de outros segmentos, como Steve Jobs (‘Apple’ que o diga, né?) já declararam ter na banda sua maior inspiração. Há boas chances de, mesmo que você não suporte Beatles, alguns de seus ídolos certamente os amem.


Para fechar com alguns dados frios, vamos pegar a maior e mais longeva banda de rock do mundo: os Rolling Stones, que completam 60 anos de carreira no ano que vem! Pois bem, os Stones venderam 200 milhões de discos, os Beatles venderam 600 milhões. Os Stones venderam 10.1 milhões de singles, os Beatles venderam 1.6 BILHÕES. Se levarmos em conta apenas o Álbum Branco, os Beatles venderam mais discos que a discografia inteira do Hendrix! Estamos falando de uma banda que lançou seu último trabalho em 1970 e continua rendendo MUITO até hoje.


2021 está na reta final, e em breve poderemos saborear e renovar a alegria de ver a banda em ação novamente no filme Get Back, a versão menos pesada de Peter Jackson para o famigerado Let It Be. Preparem-se para rir e chorar enquanto viajam no tempo!


“E no fim, o amor que se leva é igual ao amor que se dá.”

Cheers!


-Sérgio Máximo Jr





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